Escola sem concepção consistente é como navegar sem bússola!



Crédito foto: Aline Leão


Adrianna Nunez

— Tanto faz ensinar apresentando fonemas e sílabas ou alfabetizar com textos, o que importa é que os alunos aprendam!

— Se a criança não consegue aprender a ler e escrever pelo construtivismo, não há problema fazer algumas atividades baseadas no método fônico!

— Ensinar a partir do método fônico é mais eficaz e mais rápido!


Estes são alguns comentários que costumamos ouvir vez ou outra quando a pauta da conversa é a alfabetização inicial. Estas falas sempre estiveram presentes nos discursos e surgem agora, nestes “novos tempos”, com uma “força” diferente... Sabemos que não é de hoje a discussão, a contraposição entre as perspectivas teóricas disponíveis para alfabetizar, mas no momento, a retomada e a defesa de certas posições já consideradas ultrapassadas ganham destaque. Por isso, acreditamos que é importante analisarmos estas afirmações, já que nos fazem pensar em aspectos que a escola e seus professores e educadores no geral precisam ter clareza e consistência.

É imprescindível que a escola faça uma escolha, opte por uma concepção, por uma forma de compreender a educação e os processos de ensino e aprendizagem. Esta decisão é importante porque é somente a partir desta definição que conseguirá atribuir sentido ao que realiza, dar sustentação ao seu dia a dia, guiar suas ações didáticas, definir a relação entre professor e aluno. Um projeto educativo consistente depende disso!

É bastante perigoso para o processo de ensino e para a trajetória escolar dos alunos quando a instituição coloca foco apenas em sua prática e não pensa a teoria que a sustenta (porque sempre existe uma!). Como diria Paulo Freire, a prática pedagógica nunca é neutra, é uma teoria do conhecimento posta em prática, seja ela consciente ou não. Não definir a concepção e não pensar a prática a partir desta provoca, consequentemente, sérios problemas, e funda uma escola que permanece totalmente à deriva, sem rumo certo, uma escola sem critérios para tomar decisões, sem intencionalidade em suas ações. Uma prática que se esgota na prática perde o referencial.

Entre os problemas que surgem com a não definição de uma concepção de educação ou com a falta de clareza da mesma, podemos citar: professores que permanecem desamparados no seu fazer pedagógico e, por não saberem onde devem ancorar suas decisões, não possuem critérios para planejar, encaminhar e avaliar os processos (de ensino e de aprendizagem); instabilidade no projeto educativo, notada pela presença de atividades que não dialogam entre si e que despontam a partir de práticas totalmente diferentes (não existindo consonância no projeto); professores que dizem ensinar e alunos que mostram que não aprenderam.

Escolher uma concepção de ensino e de aprendizagem é pensar como concebemos o sujeito que aprende, como entendemos o processo de aquisição do conhecimento e tudo o que se relaciona a ele, o que entendemos por conteúdos a serem ensinados e qual o papel do professor. Esta escolha, que deve ser uma escolha institucional (e não individual, de cada professor), incide diretamente no “clima” educacional instalado na escola, na elaboração das situações didáticas planejadas e oferecidas, na forma de organizar a sala de aula, na maneira de agrupar as crianças, na postura do professor durante a realização das atividades, no tipo de apoio que o professor oferece, na natureza dos materiais de apoio que podem ser oferecidos, no modo de olhar para o “erro”... – logo, não dá para mesclar concepções, cada uma delas tenciona para lados totalmente divergentes. No caso da alfabetização, a escola precisa escolher de que modo olhará para o processo de aprendizagem da leitura e da escrita de seus alunos e consequentemente como irá ensiná-los.

Não! Os fins não justificam os meios! É certo que tanto o método fônico como a alfabetização que está pautada na concepção construtivista têm como finalidade que as crianças se alfabetizem. Mas, precisamos considerar que estas duas posições entendem a alfabetização de formas muito diferentes. Enquanto de um lado os alunos vistos como sujeitos passivos, cujos saberes e processos internos não são considerados e que recebem conteúdos pré-estabelecidos, estão diante de um ensino que prioriza a apresentação de fonemas para que, ao juntá-los, possam formar sílabas e palavras, do outro encontramos crianças que são consideradas ativas, que formulam hipóteses próprias e que se esforçam cognitivamente para compreender o funcionamento do sistema de escrita, além de, concomitantemente, conhecerem e fazerem uso de comportamentos/ações que escritores e leitores colocam em jogo quando produzem e estão diante de textos reais.

Portanto, tais formas de conceituar a alfabetização trazem para a prática de sala de aula princípios que não são compatíveis, e que deles dependem a tomada de inúmeras decisões que diariamente são feitas pelo professor. Toda a ação didática está pautada nesses princípios e desconhecê-los é como navegar sem bússola. É primordial que a escola faça uma escolha, saiba o que a sustenta e assuma a responsabilidade pelo processo e pelos resultados que virão!


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